sábado, 24 de novembro de 2012

Resenha - A Última Carta de David Labs

Luda, apesar de inconformada, parecia já ter seu destino traçado: casaria por conveniência aos interesses familiares, e viveria para sempre em sua cidade natal, cuja população e valores Luda desprezava. Contudo, a chegada de uma carta anônima alteraria completamente o curso de sua vida e, a partir daí, sua história passaria a conter muitas lacunas, segredos e imprecisões. O que seria real, o que seria falso? Através de notícias de jornal, diários, cartas e um tanto de imaginação o narrador de A Última Carta empreende uma busca pela verdadeira história de Luda. Entre as ruas de uma pequena cidade burguesa parada no tempo e os bulevares de Paris do final da Segunda Guerra Mundial, você acompanhará a investigação de todos os mistérios que permearam a vida de Luda – desde o recebimento da primeira carta, até a chegada da última.

A Última Carta é um livro cativante desde o começo, com uma linguagem bela, uma narração deliciosa, e uma ambientação e personagens bem definidos. O autor brasileiro, David Labs, soube mesclar passado e presente, emoções e diversos sentimentos em seu livro, de forma lenta, passo a passo, para que desvendemos a história de Luda Glauben, a personagem principal desse livro com características bem peculiares.


O livro para mim foi uma grande surpresa. Quando solicitei para resenha a obra a Editora Biruta, tinha uma ideia totalmente diferente do que eu encontraria nele. Como disse, é um livro cativante em muitos dos seus aspectos, e quando menciono que tem uma linguagem lenta, passo a passo, é como o autor teve a preocupação de não deixar nada passar na história de Luda.

"... sou leitora voraz e não compreendo tudo o que leio. Acredito que as leituras exigem responsabilidade. Não se pode decorar algumas páginas e dizer que conhece um livro..."
Página 24  - trecho retirado do diário de Luda

A caçula da família Glauben tem seu destino forçado quando seus pais querem que ela se case com Lucas Gentille, filho único de uma família rica e influente na pequena cidade de Vagas do Destino. O problema é que Luda não se conforma com o casamento, não apenas pela aparência de seu noivo, mas também pelas cartas. Luda começa a receber cartas sem identificação de um admirador secreto que diz que ama ela. A jovem decide ir até o fundo com esse romance escondido, mas sua família ainda é um empecilho que trava o seu verdadeiro destino.

"... chorei, então, verdadeiramente. Meus esforços não foram infrutíferos. Tenho a pérfida propensão à destruição dos universos sagrados, mas espero a regeneração diante do relicário do amor."
Página 55 - trecho retirado do diário de Luda 

A narração é fantástica, e o autor usa verbetes bem pomposos o que engradece o enredo. E falando sobre o enredo, temos um narrador meio personagem, meio observador, e talvez, meio onisciente. Este personagem que não tem identificação tem suas palavras em primeira pessoa escritas em itálico no livro, e é ele, uma espécie de detetive, que tenta redescobrir o passado e vida de Luda, saber o que lhe aconteceu. Chegamos a vê-lo cogitar diálogos em que Luda participara, investigando seus passos. Na minha opinião o autor quis que os leitores também redescobrissem, junto com esse misterioso personagem, o passado de Luda. E isso foi um ponto positivo. O livro também tem trechos retirado do diário de Luda, onde a narração é mais rica, mas também, complexa, pois é onde a personagem larga seus sentimentos, emoções, pensamentos. O diário cobre os anos entre 1939 a 1945, e nesses anos que vemos as reviravoltas da vida de Luda. Há também a reprodução das cartas misteriosas que Luda recebia, mas uma coisa que preciso falar, é que o título do livro ficou meio vago. O livro não tem uma presença intensa de cartas, é mais ou menos o diário de Luda. O nome poderia ser O Diário de Luda ou A Vida de Luda, ou não sei o que, mas acho que A Última Carta não foi o título perfeito que bata com o conteúdo do livro.

"Por sorte a carta não foi desviada. Possivelmente foi recolhida por Etel e entregue à destinatária ou, talvez, tenha sido depositada na caixa de correspondências em uma tarde em que Luda estava na varanda avaliando os acontecimentos recentes, como atesta seu estado de ânimo descrito numa das páginas de setembro."
Página 90 - trecho da narração do personagem misterioso

O final de A Última Carta é o ponto máximo da vida de Luda. David Labs cria veredas que não passariam por nossa imaginação no começo do livro, e vemos a transformação, evolução, senão revolução e rebelião de Luda, uma personagem inocente, inconformada, mas que passa a ser adulta e cheia de si. Teve vezes que achei ignorante Luda, mas a vida foi ignorante com ela, apesar de seus feitos não terem 100% minha aprovação. Fora isso, o desfecho do livro é tão bom como todo o livro, e Labs nos entrega uma história que não é um mar de flores, que não possui uma protagonista certinha, mas sim, como a vida é, se tomarmos as atitudes certas.

"Tanto tempo passei revoltada contra o mundo. Tanto tempo esperei sem respostas. Tanto tempo idealizei e odiei (...). Agora, quando vejo a morte se aproximando, penso em nós com clareza. Nosso amor valeu cada momento de sofrimento. Levo comigo a lembrança de nuvens negras sobre Saint-Eutache. Quando fecho os olhos, é daquela igreja que me lembro. E nosso beijo é novamente abençoado pela chuva fina. Ela será eterna."
Página 134 - trecho de uma das cartas de Luda 

O trabalho gráfico da Editora Biruta é de se apreciar! E mais ainda as ilustrações e capa, feitas por Gustavo Piqueira da CASA REX. Os desenhos são abstratos, e na minha opinião, é uma analogia a mente de Luda e ao seu mundo. Os traços ficam sobre traços, mas você consegue visualizar o interior do desenho, mas mesmo assim está confuso. Gostei muito disto.

Para fechar a resenha, digo que recomendo o livro, mas vá sem expectativas, pois assim você se surpreenderá e apreciará mais ainda a narração e enredo de David Labs.

Classificação do Livro:






Sobre o Livro:

Título Nacional: A Última Carta
Ano de Lançamento: 2012
Número de Páginas: 140 páginas
Editora: Biruta










Sobre o Autor e Ilustrador:

David Labs
Sobre o Autor: é sociólogo, professor universitário e atua como articulista. Nascido em Assis (SP), venceu o prêmio AFALESP de 1997, com o conto O Homem Só e, nas edições seguintes, classificou as obras O Caso dos Filhos de Job e Cotidiano, garantindo o segundo e terceiro lugares nos certames.  Publicou recentemente dois contos em uma coletânea e A Última Carta é seu primeiro romance.
Sobre o Ilustrador: Gustavo Piqueira dirige a Casa Rex (www.casarex.com http://www.casarex.com//), casa de design com bases e São Paulo e Londres e é o designer com mais trabalhos selecionados na história da Bienal ADG de Design Gráfico (48) além de ter recebido dois prêmios Jabuti e diversos prêmios internacionais de design. Gustavo também já publicou 10 livros entre eles os fictícios como "Marlon Brando - Vida e Obra" (Martins Fontes, 2008) e "Manual do Paulistano Moderno e Descolado" (Martins Fontes, 2007), e os infanto-juvenis "A Vida sem Graça de Charllynho Peruca" (Biruta, 2009) e "Eu e os Outros Pioneiros da Aviação" (Escala Educacional, 2007), ambos selecionados para o PNBE 2010. Entre 2000 e 2004 foi diretor da Associação dos Designers Gráficos do Brasil e entre 2000 e 2005 deu aulas na Faculdade Senac. Também desenha alfabetos e ilustra livros infantis.

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8 comentários:

  1. uau, que bom que mesmo tendo poucas páginas, o autor conseguiu desenvolver uma história instigante. Estava ansiosa por esta resenha, e como eu sempre concordo com as suas opiniões sobre livros que ambos lemos, este com certeza vai para minha listinha de desejados.
    bj

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  2. Olá!
    Falando sério, gostei bastante da sua resenha. Apesar de não parecer ser um livro de grandes proporções, aprecio o modo como um autor pode criar tramas bem elaboradas a partir de cenários corriqueiros do dia a dia. Nos faz acreditar que aquilo poderia acontecer com qualquer um. Com certeza vou comprar.

    Tem um meme duplo para você no meu blog. Espero que goste =D http://labsandtags.blogspot.com.br/2012/11/meme-duplo-laco-de-incentivo-leitura_23.html

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    1. Pois éh, leia sim, o autor soube muito bem conduzir a história!

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  3. Eu ainda não conheço o trabalho da Editora Biruta, mas vou procurar, porque eles parecem ter um catálogo bem diversificado. Sempre fico meio frustrada quando tenho certas expectativas com relação a um livro, e acabo não sendo correspondida. Ao mesmo tempo, acho que é aí que percebemos a qualidade de um autor: se ele soube nos surpreender de forma negativa ou positiva.

    Abraços!

    Lu Tazinazzo
    http://www.aceitaumleite.com/

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    1. Eu também não conhecia o trabalho da Editora Biruta. "A Última Carta" é o segundo livro da editora que leio. É verdade, varia de autor e autor!

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  4. Se tinha uma coisa que eu não poderia imaginar era que o livro passava entre a década de 30 e 40 e posso dizer que isso, somado a quantidade de elogios em relação a história e a narrativa, aumentou meu interesse pelo livro. Na verdade só agora estou conhecendo, mas também quero ver todo esse trabalho da Biruta, já que ainda não li nenhuma obra da editora.
    Você pretende resenhar os demais livros da coleção? Se sim, vou esperar pra ter certeza que devo "desejá-lo" no Skoob kkkk

    Ótima resenha!
    Abraços.
    Ricardo - www.blogovershock.com.br

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    1. Ah, o livro é muito bom... sobre a coleção, os livros são independentes em termos de história, acho que não vou resenhar os demais.

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